quarta-feira, agosto 27

Vereadores de Escada usam tribuna em tom de derrota

MP Eleitoral pediu cassação de vereadores de Escada por fraude à cota de gênero. Parlamentares reagiram em tom crítico na Câmara.

Vereadores Márcio da Água e Tárlina Patrícia do PSDB de Escada.
Vereadores Márcio da Água e Tárlina Patrícia do PSDB de Escada. Foto: Divulgação

O clima político em Escada, na Mata Sul de Pernambuco, voltou a esquentar após o Ministério Público Eleitoral (MPE) pedir a cassação dos mandatos de vereadores eleitos em 2024 pelos partidos PSDB, Agir e PRD. O pedido foi formalizado em Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aije), movidas a partir de denúncias de suplentes e ex-candidatos, que apontaram indícios de fraude à cota de gênero exigida pela legislação eleitoral.

Na última sessão da Câmara Municipal, os vereadores do PSDB, Tarlina Patrícia e Márcio da Água, usaram a tribuna para criticar o andamento do processo. Observadores classificaram o tom adotado pelos parlamentares como de derrota e indignação, embora eles não apresentassem dados concretos que dessem suporte às acusações contra o Ministério Público

O que diz o Ministério Público Eleitoral

De acordo com o MP Eleitoral, a investigação identificou elementos que configurariam fraude à cota de gênero, prevista no artigo 10, § 3º, da Lei nº 9.504/1997, que estabelece que cada partido ou coligação deve registrar no mínimo 30% de candidaturas femininas.

Os principais pontos levantados pelo órgão foram:

  • No Agir: uma candidata não obteve votos e não realizou campanha, o que indicaria candidatura fictícia. E um suplente relatou ter havido pagamento para mulheres registrarem candidaturas, reforçando a tese de fraude.
  • No PSDB: uma candidata afirmou que entrou na disputa apenas para “ajudar o partido”, tendo recebido apenas três votos.
  • No PRD: o partido não teria cumprido o mínimo de 30% de candidaturas femininas.

Com base nas apurações, o promotor eleitoral pediu a nulidade dos Demonstrativos de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) de algumas chapas, a anulação dos votos atribuídos aos partidos investigados e o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário. A medida, se acatada pela Justiça, pode levar à cassação de mandatos já em exercício.

A posição dos vereadores

Na tribuna, os vereadores criticaram a condução do processo. Márcio da Água (PSDB) afirmou que “a ação é indevida e aceita pela Justiça”. A declaração, no entanto, foi prontamente contestada por juristas locais. Nesse sentido, eles lembraram que, ao ser acolhida, a ação demonstra que o MP reuniu indícios suficientes e, portanto, permitiu que a denúncia fosse apreciada pelo Judiciário.

A vereadora Tarlina Patrícia (PSDB) foi além. Em discurso, acusou as ex-vereadoras Tia Jane e Edite de terem ingressado com a ação apenas para tentar retirar adversários do cargo. “Estão usando a cota de gênero para prejudicar mulher”, disse. Contudo, a parlamentar não rebateu diretamente as irregularidades apontadas pelo Ministério Público, como a candidatura de uma correligionária que recebeu apenas três votos.

O que está em jogo

A decisão da Justiça Eleitoral pode alterar de forma significativa a composição da Câmara de Escada. Se a Justiça julgar as Aijes procedentes, poderá cassar os mandatos dos vereadores dos partidos citados, e os suplentes assumirão as vagas.

Além da perda de mandato, a acusação de fraude à cota de gênero pode acarretar a inelegibilidade dos dirigentes partidários locais por até oito anos, conforme prevê a Lei Complementar nº 64/1990.

A importância da cota de gênero

A legislação que obriga os partidos a registrarem ao menos 30% de candidaturas femininas foi implementada para ampliar a participação das mulheres na política brasileira, historicamente marcada pela sub-representação feminina.

Quando partidos lançam candidaturas fictícias apenas para cumprir formalmente a regra, acabam distorcendo a finalidade da lei e fragilizando o processo democrático. É por isso que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o Ministério Público têm endurecido a fiscalização sobre o cumprimento da cota.

Debate político e jurídico

Especialistas destacam que o caso de Escada não é isolado. Em diversos municípios do Brasil, ações semelhantes têm resultado na cassação de vereadores e até na anulação de chapas inteiras.

Para o cientista político José Carvalho, ouvido pelo Portal Fala News, o episódio “revela a dificuldade de parte dos partidos em compreender que a cota de gênero não é uma mera formalidade, mas um instrumento legal para corrigir desigualdades históricas”.

Já advogados ligados à defesa dos vereadores afirmam que irão recorrer de qualquer decisão desfavorável e que pretendem apresentar provas para contestar as acusações.

O julgamento das Aijes em Escada deve definir o futuro político imediato de vereadores eleitos por PSDB, Agir e PRD. Enquanto os parlamentares reagem em discursos inflamados, a decisão final cabe à Justiça Eleitoral, que analisará as provas apresentadas pelo Ministério Público.

O processo expõe um dilema central: a aplicação rigorosa da lei de cotas de gênero como mecanismo de inclusão política versus a prática recorrente de candidaturas fictícias para atender formalidades. O desfecho do caso, além de repercutir na política local, pode servir de exemplo para outras cidades brasileiras.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Sair da versão mobile