sábado, maio 31

Contratos da Sinarco com a Prefeitura do Recife são investigados

Ministério Público e TCE investigam contratos da construtora Sinarco com a Prefeitura do Recife. Auditorias apontam possíveis irregularidades.

Prefeito do Recife, João Campos (PSB). Foto: Hélia Scheppa/Prefeitura do Recife
Prefeito do Recife, João Campos (PSB). Foto: Hélia Scheppa/Prefeitura do Recife

Auditorias do Tribunal de Contas de Pernambuco (TCE-PE) e um inquérito civil do Ministério Público Federal (MPF) estão apurando possíveis irregularidades em contratos firmados entre a Prefeitura do Recife e a construtora mineira Sinarco, além das empresas Alca Engenharia e Max Construções. Os valores ultrapassam R$ 119 milhões e envolvem secretarias como Educação e Saúde na gestão do prefeito João Campos (PSB).

A investigação, que ainda está em curso, analisa indícios de falhas nos processos de contratação, execução de serviços e fiscalização das obras.

Contexto: quem são as empresas envolvidas

As três empresas são citadas em auditorias e em processos judiciais que despertaram a atenção dos órgãos de controle. Veja quem são:

  • Sinarco Construções e Empreendimentos Ltda: empresa de João Pinheiro (MG), a 2.054 km do Recife. É de propriedade do empresário Cristiano Mendonça de Novaes, 49 anos. Já teve restrição para contratar com o poder público em Minas Gerais por atrasos em obras e entrega de documentos, sanção encerrada em março de 2024.
  • Alca Engenharia e Max Construções: têm como dono o pernambucano Carlos Augusto Góes Muniz, conhecido por promover eventos sociais e por manter um bloco carnavalesco em Olinda. Ambas têm atuação em obras públicas.

Alvos das auditorias: contratos com Saúde e Educação

Segundo dados públicos do TCE-PE, desde 2022, a Sinarco firmou contratos que somam mais de R$ 119 milhões com a Prefeitura do Recife, sendo os principais com as seguintes secretarias:

Secretaria de Educação

  • Contrato 1: Assinado em dezembro de 2021, com valor inicial de R$ 13,7 milhões. Após aditivos, chegou a R$ 20,4 milhões.
  • Contrato 2: Firmado em outubro de 2022 por R$ 15,8 milhões. Posteriormente ampliado para R$ 19,8 milhões.

Ambos os contratos têm como objetivo a manutenção de creches e escolas públicas e foram assinados por um consórcio em que a Sinarco figura como sócia principal.

Secretaria de Saúde

  • Contrato: Assinado em maio de 2023 por R$ 29,7 milhões. Reajustado em janeiro de 2024 para quase R$ 43 milhões.

Suspeitas: pagamentos duplicados e execução por terceiros

As auditorias do TCE-PE apontam possíveis irregularidades, como:

  • Serviços executados por empresas diferentes da contratada: documentos da Sinarco foram assinados por Carlos Muniz (Alca e Max) e por engenheiro ligado à Max Construções.
  • Parcerias por meio de SCP (Sociedade em Conta de Participação): formato legal que não exige registro público da associação.
  • Pagamentos por serviços em locais ainda em construção: como nas creches Casarão Mustardinha e do Monteiro.

A procuradora do Ministério Público de Contas, Eliana Guerra, destacou que não há clareza sobre os critérios adotados para distinguir quais empresas executaram quais serviços.

“Não foram apresentados elementos que demonstrem de forma clara a distinção entre os serviços executados por cada contrato”, afirmou a procuradora em despacho oficial.

Contratação sem licitação própria

Os contratos foram firmados sem licitação municipal, utilizando atas de registro de preços de consórcios mineiros:

  • AMMESF (Associação dos Municípios da Bacia do Médio São Francisco)
  • Codanorte (Consórcio Intermunicipal do Norte de Minas)

Esse mecanismo é permitido pela legislação brasileira, mas exige justificativas robustas.

Segundo a procuradora Eliana Guerra, a Prefeitura do Recife não demonstrou de forma inequívoca a excepcionalidade que justificaria essa adesão a atas de consórcios de outro estado.

Caso semelhante em Ipojuca

O Ministério Público de Pernambuco investigou, em 2024, um contrato firmado pela Prefeitura de Ipojuca com base em uma ata da AMMESF, resultando na prisão de um empresário. A situação reforça o alerta sobre o uso indiscriminado desse tipo de contratação.

Relação com ex-secretário do PSB

Outro ponto analisado é a atuação do escritório Falcão Ferraz e Cunha Advogados, que representa judicialmente as três empresas envolvidas.

Um dos sócios do escritório é o advogado João Guilherme Ferraz, ex-secretário de Governo na gestão de Geraldo Júlio (PSB), antecessor e aliado político de João Campos. Ferraz negou qualquer participação nos contratos com a prefeitura.

Contudo, o portal UOL teve acesso a uma procuração assinada pelo dono da Sinarco, Cristiano Novaes, incluindo Ferraz como representante legal da empresa em ações trabalhistas.

Em nova manifestação, Ferraz reconheceu que o escritório atua apenas na área trabalhista, em parceria com a Alca, sem envolvimento com os contratos administrativos investigados.

O que dizem os citados

  • Prefeitura do Recife: informou, em nota, que todos os contratos seguiram os critérios legais e que as obras executadas pela Sinarco ocorreram em terrenos anexos a construções feitas por outras empresas.
  • Alca Engenharia: afirmou que atua regularmente na região e que possui experiência técnica, sem irregularidades no processo de contratação.
  • João Guilherme Ferraz: confirmou relação profissional com a Alca, mas reforçou que não representa a Sinarco em processos administrativos, civis ou penais.

As investigações sobre os contratos da Sinarco com a Prefeitura do Recife continuam em andamento. Os órgãos de controle avaliam possíveis falhas nos processos de contratação e execução, incluindo o uso de atas de outros estados e a atuação de terceiros nas obras. A gestão municipal e os empresários negam irregularidades e afirmam que todas as contratações ocorreram dentro da legalidade.

O acompanhamento do caso pelo TCE-PE, MPF e MPPE será fundamental para esclarecer os fatos e garantir a transparência dos gastos públicos.

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